O Episódio São Paulo – The GAM#6 [curaticism]

Curadoria de Alessandro Facente
{English below}

Artistas: Renata de Bonis, Flora Leite, Maura Grimaldi, Beto Shwafaty, Daniel de Paula
Curadora convidada: Thais Rivitti

Com apoio da Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo, via PROAC, o Ateliê397 recebe em 18 de março, às 17h, O Episódio São Paulo – The GAM#6 [curaticism], uma exposição no formato Spoken-Word (painel de discussão) com curadoria de Alessandro Facente (Itália/EUA) e participação dos artistas Renata de Bonis, Flora Leite, Maura Grimaldi, Beto Shwafaty e Daniel de Paula. Thais Rivitti é a curadora convidada. Organizada na forma de uma discussão com o público, a conversa gira em torno do conceito de “deslocamento como sobreposição”.

No contexto de O Episódio São Paulo – The GAM#6 [curaticism], a sobreposição tem como objetivo significar a abordagem das práticas dos seis artistas baseados em São Paulo para reimaginar a realidade atual. Isso se expressa por meio de novas formas que competem com o visual ou o sentido da fonte original, funcionando paralelamente a ela.

A discussão considera as maneiras em que essas práticas apresentam versões alternativas da aparência do atual cenário político, econômico, social, arquitetônico, urbano, natural e histórico para questionar as contradições de sua atual situação, de forma que o que está esquecido, oculto e ainda não resolvido possa ressurgir. Sobrepondo-se uma às outras, essas versões alternativas encorajam uma discussão acerca das infinitas possibilidades da realidade ser conceitualmente rearticulada, visualmente reexpressada e criticamente rediscutida.

As recentes eleições norte-americanas e europeias mostraram globalmente a existência de novas formas de austeridade nas sociedades atuais. Seja nas formas financeira, política, social ou cultural, a crise substancial da cultura ocidental está influenciando de modo significativo a maneira como as pessoas estão reconsiderando sua compreensão do ambiente ao redor. A consequência é que suas diferentes percepções estão polarizando as pessoas, dividindo-as internamente. A xenofobia generalizada, a supressão de direitos constitucionais, as novas formas de exclusão, a censura e as discriminações são alguns exemplos do que está ressurgindo hoje em dia. Essas diferenças no nosso ambiente, por sua vez, revelam a instabilidade das nossas democracias e, o que é ainda mais importante, mostram-nos que nossas sociedades são na realidade diferentes do que pensávamos ser.

O Brasil passou por uma ditadura de 1964 a 1984. O papel da censura foi crucial, principalmente na limitação da expressão artística, fazendo com que o visual se manifestasse como simbólico. Esse equilíbrio e o equilíbrio entre a arte e a sociedade daquela época encorajam o evento público a questionar como esses artistas tratam conceitualmente, nos dia de hoje, as novas atuais formas de austeridade. Como expressam visualmente sua posição através da prática?

Intencionalmente ou não, esses artistas estão na realidade voltando a discutir o papel da arte contemporânea ao enfrentar e reagir a períodos polêmicos que acontecem e reaparecem em nossas sociedades em evolução, com práticas que se concentram no desenvolvimento de soluções visuais paralelas, capazes de inspirar os princípios fundamentais do pensamento humano, a liberdade e a emancipação. Alcançam um alto nível de execução formal em suas obras de arte, dando forma a uma cena artística local capaz de expandir os limites da indústria da arte visual, abrindo uma porta para a exploração de maneiras alternativas de desenvolver o visual, mudando radicalmente seus fundamentos e ampliando seus limites, mas ainda em oposição à realidade.


Artistas Participantes e curador convidado

Partindo dos experimentos com imagens impressas e projetadas, textos e exercícios de fala, o trabalho de Maura Grimaldi (1988, São Paulo) refere-se constantemente à fotografia, em seus modos de exibição e arquivamento. Seu interesse reside em temas como fantasmagoria, o invisível, tecnologias fotográficas obsoletas e dispositivos relacionados à experiência imersiva da contemplação da imagem (panoramas, salas escuras, lanterna mágica e outros dispositivos ópticos).

A pesquisa de Renata De Bonis (1984, São Paulo, Brasil) gira em torno de questões que se sobrepõem a estruturas temporais, como o geológico e o mundano, bem como a relação da sociedade contemporânea com a natureza e dentro dela, a ecologia e a sublime paisagem mediada por imagens. Isso se reflete na escolha de materiais e procedimentos, desde galhos e rochas encontrados até gesso, concreto, chumbo e objetos cotidianos, bem como o uso extensivo de som e silêncio como matéria construtiva. Em sua prática, há uma necessidade de dar atenção ao aparentemente invisível, esquecido e insignificante.

A prática de Flora Leite (São Paulo, 1988) parte de um olhar para o mundo que tenta compreender a incompatibilidade entre a vida cotidiana e seus objetos, paisagens e imagens – acolhendo a sujeira das coisas para testar até que ponto não podemos viver com elas, dizer algo sobre elas, e apesar delas. Os padrões dos produtos industrializados, os parâmetros de gosto, a distância entre nós e as paisagens ao redor, capturados dia após dia, é o que ela pretende expor na economia do seu trabalho. Na mesma velocidade iconográfica desses objetos de gosto comum, desmente o caráter contemplativo das operações propostas, o que é feito de forma a observar os parâmetros com os quais o nosso olhar foi colonizado.

O trabalho de Beto Shwafaty (1977, São Paulo) conecta-se às práticas coletivas, curatoriais e espaciais desde o início dos anos 2000, gerando uma metodologia baseada na pesquisa sobre espaços, histórias e visualidades, que envolve formal e conceitualmente questões políticas, sociais e culturais que convergem para o campo da arte. A metodologia do artista associa o pensamento curatorial, estratégias institucionais, apropriações e deslocamentos a projetos de pesquisa desenvolvidos ao longo de períodos extensos, ampliando seu escopo e testando novas formas de exibição e configurações espaciais cada vez que são expostos. O artista tem profundo interesse na maneira em que os acontecimentos históricos podem se manifestar na cultura, nos objetos projetados e nas estruturas espaciais, que, consequentemente, produzem significados e comportamentos compartilhados publicamente.

O trabalho de Daniel de Paula (Boston, EUA – 1987) procura ativar e esgotar uma multiplicidade de agentes e relações em um dado contexto espacial. Sua obra parece dotada de vitalidade, uma força silenciosa resultante de atributos subtraídos do próprio comportamento e da história dos objetos, lugares e ações comuns em uma paisagem urbana. As operações empregadas pelo artista sugerem um vínculo indivisível entre os objetos apresentados e as ações que lhes dão existência, presença e significado. Através de estratégias como negociações ampliadas com as estruturas da cidade e dentro delas, o deslocamento de objetos cotidianos, a apropriação da infraestrutura pública e a interação com agentes constitutivos do espaço expositivo e sua paisagem circundante, suas peças, instalações e intervenções tentam desarticular, reconstruir e resignificar abordagens espaciais e conceituais rígidas e condicionadas em sistemas e configurações.

 Thais Rivitti é curadora e crítica de arte, integrante do conselho diretor do Ateliê397. Desde 2010, trabalha no desenvolvimento da programação do espaço de arte. Com interesse especial pela arte contemporânea brasileira, Thais entende a arte como um objeto social e estético, que caminha junto com outras áreas do conhecimento como Filosofia, Sociologia e Economia. Por esse motivo, sua trajetória profissional privilegia artistas que trabalham no cruzamento de linguagens e refletem sobre o papel da arte na sociedade.

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O Episódio São Paulo – The GAM#6 [curaticism] é resultado da residência de dois meses de Alessandro Facente no Ateliê397, em que continuou com sua pesquisa The GAM [curaticism] através do envolvimento ativo com artistas locais em um intenso período de visitas a estúdios, escrita, entrevistas e conversas.


THE GAM [curaticism]
Tomando emprestado o título do capítulo 53 de Moby-Dick, de Herman Melville (no qual ‘gam’ é usado para descrever um encontro social de dois navios baleeiros), The GAM é uma série itinerante, organizada pelo curador, de exposições no formato spoken-word (painel de discussão), em que um grupo escolhido de artistas de diferentes lugares ou origens se reúne para compartilhar as conexões coerentes, identificadas pelo curador, entre os conceitos e tradições incorporados em seu trabalho e investigar como as novas geografias (relacionadas às culturas, comunidades, direitos sociais, etc.) influenciam sua prática. As exposições no formato spoken-word são estruturadas de modo a pedir que aos artistas aprofundem as maneiras em que suas ideias nascem e se solidificam, colocando suas experiências em palavras para um público. Os curadores convidados são envolvidos como pontos de vista externos acerca das questões abordadas pelos artistas durante essas sessões públicas.

As últimas cinco edições de The GAM foram realizadas em diferentes locais e instituições, incluindo a NARS Foundation, no Brooklyn, em 2014 e 2015 e o HIAP (Helsinki International Artist Program), em 2016. O Episódio São Paulo – The GAM # 6 marca o início da sexta edição da série.

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The GAM é parte do projeto de grande escala chamado CURATICISM, uma atitude contínua de curadoria em que o papel do curador é desempenhado como observador e testemunha da maneira em que o artista faz uma obra de arte, isto é, do conceito à criação final. Desenvolvido pelo curador Alessandro Facente, CURATICISM identifica várias atividades que, embora moldadas a cada vez de diferentes formas, têm como objetivo explorar a situação atual do “embedded curator”, uma longa discussão bastante enraizada na prática do artista, cujo trabalho é profundamente ligado ao gesto do artista e sua evolução ao longo do tempo.

Serviço:
O Episódio São Paulo – The GAM#6 [curaticism]
Dia 18 de Março, às 17h.

Ateliê397
Rua Professor Gonzaga Duque 148, Pompeia.
Tel: 3865 2220
https://atelie397.com/


 

The São Paulo Episode – The GAM#6 [curaticism]

Curated by: Alessandro Facente

Artists: Renata de Bonis, Flora Leite,  Maura Grimaldi, Beto Shwafaty, Daniel de Paula
Guest curator: Thais Rivitti

 

On March 18th, 5pm, Ateliê397 with support of São Paulo Department of Culture (through PROAC program), hosts The São Paulo Episode – The GAM#6 [curaticism], a Spoken-Word Exhibition curated by Alessandro Facente (Italy/USA) with artists Renata de Bonis, Flora Leite, Maura Grimaldi, Beto Shwafaty, Daniel de Paula and Thais Rivitti as a guest curator. In the form of a public talk, the conversation centers around the concept of “displacement as overlapping”.

Within the frame of The São Paulo Episode – The GAM#6 [curaticism], overlapping is intended to signify the approach of these six São Paulo-based artists’ practices to re-imagine the current reality. This is expressed through new forms that compete with the visual or the sense of original source and function as parallel to it.

The talk considers the ways in which these practices provide alternative versions of the appearance of the current political, economical, social, architectural, urban, natural and historical landscape to question the contradictions of its current status in order for what is forgotten, hidden and still unresolved to re-emerge. Overlapping one another, these alternative versions encourage a conversation on the infinite possibilities of reality to be conceptually re-articulated, visually re-expressed and critically re-discussed.

The recent U.S. and European elections have globally shown the existence of new forms of austerity in today’s societies. Whether in the financial, political, social and cultural forms, this West culture’s substantial crisis is dramatically influencing the way people themselves are now reconsidering their understanding of their surrounding environment. The consequence being that different perceptions of it are polarizing people, dividing them internally. Widespread xenophobia, suppression of constitutional rights, new forms of exclusions, censorship and discriminations are some examples of what is re-emerging nowadays. These differences in our environment are in turn informing us of the unstable condition of our democracies most importantly, the different appearance of our societies from what we thought they were to what they actually are.

Brazil experienced dictatorship from 1964 to the 1984. The role of censorship was crucial, especially in limiting the artistic expression in a way that the visual manifested itself as symbolic. This balance and the balance between art and the society at the time, encourages the public event to question how are these artists conceptually handling today, the current new forms of austerity? How do they visually express their position through the practice

Intentionally or unintentionally, these artists are in fact re-discussing the role of the contemporary art in facing and reacting to controversial periods that keep happen and re-happen in our evolving societies, with practices that focus at developing parallel visual solutions able to inspire the fundamental principles of the human thinking freedom and emancipation. They reach a high level of formal execution in their artwork, giving shape to a local art scene, able to push further the boundaries of the visual art industry, opening a door to the exploration of alternatives ways to develop the visual, even radically changing its foundations, pushing forward its boundaries but still in opposition to the reality.


The Participating Artists and guest curator

Departing from the experiments with printed and projected images, texts and speech exercises, Maura Grimaldi’s work (1988, São Paulo) constantly refers to the photography, in its exhibition and archiving modes. Her interest lies in subjects such as phantasmagoria, the invisible, obsolete photographic technologies and devices related to the immersive experience of image contemplation (panoramas, darkrooms, magic lantern and other optical devices).

Renata De Bonis’ (1984, São Paulo, Brazil) research revolves around concerns that overlap temporal frameworks, such as the geological and the mundane and the relationship of contemporary society with and within nature, ecology and the sublime image-mediated landscape. This reflects on her choice of materials and procedures, from found branches and rocks to plaster, concrete, lead and everyday objects, as well as the extensive use of sound & silence as constructive matter. In her practice there’s a need to give attention to the apparently invisible, forgotten and insignificant.

Flora Leite’s (São Paulo, 1988) practice starts from a gaze at the world that tries to comprehend the mismatch between daily life and its objects, landscapes and images – abiding things’ dirtiness to test to which point we can’t live with them, say something about them, and despite them. Industrialized product patters, the parameters of taste, the gap between us and surrounding landscapes, caught day in and day out, are what she intends to expose in the economy of her work. And, in the same iconographic speed of these average taste objects, comes amiss the contemplative character of the proposed operations, done in way to observe the parameters with which our gaze has been colonized.

Beto Shwafaty‘s (1977, São Paulo) work has been connecting to collective, curatorial and spatial practices since the early 2000s, generating a research-based methodology on spaces, histories and visualities which connects formally and conceptually political, social and cultural issues convergents to the art field. The artist’s methodology combines curatorial thinking, institutional strategies, appropriations and dislocations in research projects developed over extended periods of time, expanding their scope and testing new displays and spatial configurations each time they are exhibited. He is deeply interested in the way historical episodes can be echoed on culture, on designed objects and spatial structures, which by consequence, produce publicly shared meanings and behaviours.

Daniel de Paula’s work (Boston, USA – 1987) seeks to activate and exhaust a multitude of agents and relations in a given spatial context. His work seems invested with vitality, a silent forcefulness derived from qualities subtracted off the very own behavior and history of ordinary objects, places, and actions in an urban landscape. The operations employed by the artist suggest an indivisible bond between the objects presented and the actions that give them existence, presence, and significance. Through strategies such as amplified negotiations with and within city structures, displacement of quotidian objects, appropriation of public infrastructure, and interaction with constitutive agents of the exhibition space and its surrounding landscape, his pieces, installations, and interventions attempt to disarticulate, reconstruct and re-signify rigid and conditioned spatial and conceptual to systems and configurations.

Thais Rivitti art critic and curator, part of Ateliê397 directive board. Since 2010, works on the development of the art space program. Particularly interested in Brazilian contemporary art, Rivitti intends art as a social and esthetic object, that walks together with other knowledge fields such as Philosophy, Sociology and Economics. That’s why her professional trajectory privileges artists that work in the crossing of languages and reflect about the role of art in the society.

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The São Paulo Episode – The GAM#6 [curaticism] is the result of Alessandro Facente’s two months-long residency at Ateliê397, in which he has pursued his research The GAM [curaticism] by actively engaging with local artists through an intense period of studio visits, writing, interviews, and conversations.


THE GAM [curaticism]

Borrowing the title from the 53rd chapter of Herman Melville’s Moby-Dick – (in which the ‘gam’ is used to describe a social meeting of two whale-ships) – The GAM is an itinerant curator-driven series of spoken-word exhibitions during which a selected group of artists from different places or backgrounds come together to share the coherent connections, identified by the curator, between concepts and traditions embedded within their work and how new geographies (as related to cultures, communities, social rights, etc.) influence their practice. This spoken words exhibitions are structured in such a way as to ask the artists to dig deep in the ways their ideas are born and solidified, putting their experiences into words for an audience. Guest curators are involved each time as external points of view on issues addressed by the artists during these public sessions.

The previous five GAM episodes were hosted by different venues and institutions, including NARS Foundation, Brooklyn in 2014 and 2015 and HIAP (Helsinki International Artist Program) in 2016. The São Paulo Episode – The GAM#6 [curaticism] marks the start of the sixth chapter of this series.

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The GAM is part of the large-scale project CURATICISM, an ongoing attitude of curating in which the curator’s role is played as observer and witness of the artist’s way of making a piece of art, i.e. from the concept to the final creation. Developed by the curator Alessandro Facente, CURATICISM identifies several activities that, although shaped each time in different forms, have the goal to explore the current status of the embedded curator, a long-form voice deep seated in the artist’s practice, whose work is deeply linked to the artist’s gesture and its evolution over time.