Sessão Corredor + Extras | Pixel Carne

Pixel Carne
{english below}


Stan Brakhage dizia que o artista lida essencialmente com:
1) nascimento; 2) sexo; 3) morte; 4) a busca por Deus.

Sigo essa ideia de forma literal, pornográfica.
(Brakhage gostava de filmar umas coisas obscenas também)

Se a obra não excita, restam as legendas.
Gozar com o pau/grelo alheio.
(e se a pornografia, na vida social, é uma bomba de dopamina que pode viciar, no reino das imagens o seu gesto bruto e revelador é a única chance de plenitude.)

A definição original do termo pornografia é: “escritos sobre prostitutas”.
Parece uma definição anacrônica, frente aos avanços morais e tecnológicos – boa parte da escrita hoje é visual – trazidos pela modernidade.

Mas falo sobretudo de um dispositivo, de uma forma de se relacionar com o mundo: direta, confrontativa, dualista, bicho-versus-natureza, de uma beleza honesta porque escancaradamente efêmera e previsível, tal como as Civilizações aos olhos da Terra. O triunfo da vegetação é total.

a vida entrega-se em excesso
torna-se imaturo

a arte resguarda-se em excesso
torna-se neurótico

diria Lao Tsé pós-Lipovetsky,
ou um Epicuro sadeano.

(A propósito: arte e vida não se misturam mais.
Ou podemos tirar a parte sobre nazismo na bio do Beuys, se achar melhor)

Seria redundante falar em filmar ou fotografar pornograficamente. As câmeras, intrusivas e sedutoras – porque amorais – como toda máquina, já o fazem a todo momento.

A natureza da imagem é prazerosa e violenta.
Vou repetir a palavra natureza em itálico porque gosto do tabu que ela se tornou.
(Camille Paglia voltará a ficar na moda, aguardem.)

Em períodos nascentes de uma nova tecnologia, o deslumbramento com seu manejo sobrepõe-se a maiores pudores.
Foi assim com a película cinematográfica. (google: elefante eletrocutado thomas edison)
É assim com as teratoneladas de pixels descarregados no YouTube, PornHub ou na deep web.

Mordidas as primeiras maçãs da árvore, porém, logo surge a autocensura.

No auge econômico do Cinema, com seus theatros lotados, o mostrar demais era antes um problema moral, mas também estético:

Temos a tecnologia para mostrar,
mas em meio a tantos estímulos da modernidade, devemos conter a libido.

nota de rodapé: Até hoje, armas fálicas e fluidos
sanguíneos ainda recebem aceitação pública muito maior
que genitais reais e fluidos sexuais. Não há equivalente sexual
de Tarantino no cinema dito respeitável.

No auge econômico da Arte pós-Fim-da-Arte, com suas galeria$ e feira$ gigantescas (gosto delas) o mostrar demais é agora um problema estético, mas também moral:

Temos a tecnologia para mostrar,
mas em meio a tantos estímulos da era da internet, devemos conter a retina.

 

O novo conservadorismo é duchampiano.

O erotismo conceitual será derrubado pela pornografia do belo. Acabará a tirânia da penitência.

São Paulo, junho de 2016


Sessão Corredor + Extras – Pixel Carne

O Ateliê 397, com apoio da Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo, via ProaC, convida a todos para a abertura da primeira Sessão Corredor + Extras – 2016, com a mostra Pixel Carne.

A presente mostra, do cineasta e artista visual Krefer, reúne obras que permeiam o cinema de vanguarda e o universo sadomasoquismo e do fetichismo, a serem apresentadas no espaço do Ateliê397 no dia 01 de julho, às 20h30.

O termo composto Pixel Carne refere-se à dualidade encontrada em instâncias como o digital e o físico, o cerebral e o instintivo, o cultural e o natural, o amoral e o emocional.

Krefer utiliza-se desde códigos do cinema experimental, sob a influência de nomes como Stan Brakhage e Peter Kubelka, ao universo de autoretems como Sade, Bataille e Pauline Réage. Seus vídeos retratam a relação entre desejo e violência de forma frontal, a partir de dispositivos e estruturas claras e rigorosas.

O evento é composto por uma sessão de vídeo dividida em duas partes: em Assertivas, o artista exibe sua mais recente produção; a segunda parte, intitulada Diálogos, contempla uma seleção de obras de uma gama variada de artistas que dialogam com o seu trabalho.

Também integram a mostra mais três peças visuais instaladas no espaço do ateliê397, que serão apresentadas junto à festa de encerramento com a participação da DJ Giu Nunez ao final da noite.

O projeto Sessão Corredor + Extras é dedicado a exibições de vídeo-arte a céu aberto. A cada edição, o artista/curador da mostra convida um performer ou dj a se apresentarem como extra que dialoga com o contexto do programa.

 

Programa 1: ASSERTIVAS

Deus
dir: Krefer, 4’, 2010

Estudo de Persistência
dir: Krefer, 2’, 2014

Action Painting No. 1 / No. 2
dir: Krefer & Turca, 7’, 2014

Estudo Cromático
dir: Krefer & Matsu, 3’, 2015

Fonte Invertida
dir: Krefer, 45’’, 2014

Graça ou Honra (Tobias, 14 Anos, Dachshund com Vira-Lata, 1 Ninhada de 8 Filhotes, Castrado)
dir: Krefer, 2’, 2015

 

Programa 2: DIÁLOGOS

Sangre
dir: Cris Ventura, 3’, Brasil, 2009

Mes Séances de Lutte [trailer]
dir: Jacques Doillon, 1’, França, 2013

Rubber Duckie
dir: Henry Alberto, 16’, E.U.A., 2012

Waning
dir: Gina Haraszti, 8’, Canadá, 2011

Sébastien Tellier – Cochon Ville
dir: Alex Courtès, 3’, França, 2012

+ EXTRAS
(exposição de obras de Krefer em fotografia e arquivo GIF)

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Programação Gratuita

Sessão Corredor + Extras / Pixel Carne
Dia 01 de julho, às 20:30h

Festa com DJ (Giu Nunez)
A partir das 23h

Local: Ateliê397
Rua Wisard, 397 – Vila Madalena

Mais informações:
Tel: 3034-2132
https://atelie397.com/

 

*

 

Krefer (Curitiba, 1987; vive entre São Paulo e Curitiba) trabalha desde 2008 com cinema e formas derivadas da imagem em movimento. Investiga temas como o desejo, presença e morte. Seus filmes tiveram ampla circulação em festivais dedicados à sexualidade, como o Berlin Porn Film Festival, Pop Porn e o La Fête du Slip, na Suíça (onde também foi premiado). Sua obra recebeu, em 2015, uma retrospectiva no 25º Curta Cinema – Festival Internacional de Curtas do Rio de Janeiro. Realizou a individual Translúcido no Museu Oscar Niemeyer (Curitiba), além de coletivas no festival Incubarte (Madri), no SPA das Artes (Recife) e nas galerias Defibrillator (Chicago) e SomoS (Berlim), entre outras. Entre 2012 e 2014 foi curador do Olhar de Cinema – Festival Internacional de Curitiba.

http://krefer.net


Stan Brakhage used to say that artists basically deal with:
1) birth; 2) sex; 3) death; 4) the search for God.

I follow this idea in a literal, pornographic way.
(Brakhage enjoyed filming some dirty things too)

If a work of art doesn’t turn you on, you’re left with the curatorial text.
An orgasm by someone else’s cock/clit.
(and if pornography in social life is a hit of dopamine that may become an addiction, in the realm of images its gross and revealing gesture is the only possible path to fulfillment.)

The original definition of the word pornography is: “writings about prostitutes”.
Seems like an anachronistic definition, considering moral and technological progress – much of today’s writing is visual – brought by modernity.

Above all, I’m speaking of a device, a way to deal with the world: direct, confrontational, dualistic, beast-versus-nature, honestly beautiful because openly ephemeral and predictable, like Civilizations from the perspective of Earth. The triumph of vegetation is total.

life gives itself too much
one becomes immature

art hides itself too much
one becomes neurotic

would say Lao Tsé after Lipovetsky,
or a Sadean Epicurus.

( By the way: art and life do not merge anymore.
Or we can remove all Nazi parts from Beuys’s bio [*if you like] )

It would be redundant to talk about filming or photographing pornographically. Cameras, intrusive and seductive – because they are amoral – as any machine, already do it all the time.

The nature of images is pleasurable and violent.
Here I repeat the word nature, in italics, because I like the taboo it has become.
(Camille Paglia will be trendy again, just wait and see.)

In times when new technologies emerge, the fascination with the way they are handled overrides any qualms.
This is what happened to celluloid film. (google it: electrocuted elephant thomas edison)
This is what happens to the teratons of pixels uploaded on YouTube, PornHub or the deep web.

Bitten the first apples of the tree, however, soon you have self-censorship.

In the golden age of Hollywood, with its crowded theaters, showing too much was primarily a moral issue, but also an aesthetic one:

We have technology to show it,
but amongst so much stimulus from modernity, we better restrain our libido.

footnote: To date, phallic weapons and blood fluids are still
more tolerated by the public than actual genitals and
sexual fluids. There’s no sexual equivalent of Tarantino in
the so-called serious cinema.

In the golden age of post-End-of-Art art, with its gigantic gallerie$ and fair$ (I like them), showing too much is now an aesthetic issue, but also a moral one:

We have technology to show it,
but amongst so much stimulus from the internet, we better restrain our retinas.

The new conservatism is Duchampian.

Conceptual eroticism will be knocked by the pornography of beauty.

 

São Paulo, June 2016