Ai, pareciam eternas (3 lamas)
Nuno Ramos, em Ai, pareciam eternas (3 lamas), apresenta três grandes esculturas em forma de casas que parecem naufragar em barro, leite e um líquido preto, pouco viscoso para ser piche, muito volumoso para ser nanquim. Afundando em seu último respiro antes de ser totalmente encobertas por poças que desenham seus próprios perfis-elevações arquitetônicas, as casas de seus pais, avós e sua primeira residência, casas de extremo valor simbólico para o artista, são absorvidas pelo chão da galeria: o grande espaço expositivo estaria ingerindo de modo a se utilizar daquelas casas onde Ramos teve sua infância e adolescência, utilizando delas como estrutura para se sustentar? Ou tomando o papel destes lugares de experiências primeiras, enquanto Ramos tem de se desvencilhar de afetos tão profundos para se colocar em uma economia –da arte, do adulto, do artista maduro?
De qualquer modo, Ramos sugere que o espaço da galeria, é muito maior e mais profundo do que o chão que pisamos indica. Não só o espaço físico da Galeria Celma Albuquerque, onde realiza a obra, mas uma dimensão que os olhos não alcançam em todo o espaço do circuito onde ela, a galeria, contém o artista e é inserida. E aquelas casas, tão pessoais, fundamentais para a sobrevivência deste circuito, que pareciam eternas, permanecem na memória do artista cada vez mais distante.
Mas estas casas não afundam, estão estáveis e às vezes parecem até emergir deste chão. Anacronicamente, parecem surgir das poças, como se a galeria, espaço de exposição pública e sistemática do profissional, gerasse a casa dos jantares da avó, transfigurada em cerâmica, mármore, madeira negra. Afinal, qual o significado desta eternidade: estas casas tanto pareciam eternas para o seu morador àquele tempo, que já vislumbrou um futuro em que elas o acompanhariam até o fim, mas também parecem naturais paisagens, casas que surgiram com aquela montanha, criadas por Deus como a árvore ao seu lado, esculpida com enorme paciência pela água como a nascente do riacho. Pareciam de um passado tão eterno quanto a tradição de sentar ao redor da refeição e ouvir da avó com atenção enquanto se mastiga sem fazer muito barulho. Foram geradas em sua construção civil pelos pedreiros e engenheiros civis, pelos planos de urbanização do estado de Minas Gerais, mas construídas inúmeras vezes em lembranças pessoais e reconstruídas para ser compartilhadas com outros em seus trabalhos.
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